Fonte: Correio Braziliense – Jornalista Helena Mader – publicação em 08/06/2013
ADMINISTRAÇÃO / Levantamento mostra que 343 servidores foram demitidos pelo GDF na última década, 26% deles por improbidade, lesão aos cofres públicos ou acusados de tirar proveito próprio do cargo e metade por deixar de exercer a função
Irregularidades como cobrança de propina, acumulação indevida de vagas, desvio de recursos públicos ou abandono do cargo levaram à demissão de 343 servidores do Governo do Distrito Federal (GDF) na última década. Entre os banidos da administração local, 85 perderam o cargo nesta gestão. Os dados fazem parte de um levantamento da Secretaria de Transparência do DF, ao qual o Correio teve acesso. Dos demitidos desde 2003, 51% receberam a punição por terem abandonado a função. Os casos de servidores flagrados por improbidade, lesão aos cofres públicos e por tirar proveito próprio da função correspondem a 26% (confira quadro).
Entre as categorias punidas por infrações graves, como corrupção, a Polícia Civil é uma das principais origens dos servidores demitidos. Ao todo, 32 integrantes da corporação foram banidos dos quadros do GDF na última década e, desses, somente dois abandonaram o emprego. Um dos casos que aparecem na lista da Secretaria de Transparência é o do ex-policial civil Hildegilson Aguiar Cavalcante. Em 2000, segundo denúncia do Ministério Público, ele e outros homem prenderam um suspeito que seria fugitivo no Paraná. Eles teriam dito à mulher do suspeito que, se não fizesse a transferência de um veículo para o grupo, ela jamais veria o marido novamente. As vítimas então entregaram o DUT assinado ao policial e seus comparsas.
Hildegilson respondeu por extorsão, cárcere privado e improbidade administrativa. Em 2001, a Corregedoria da Polícia Civil abriu procedimento para investigar a conduta do policial. Em 2004, o DF demitiu o agente da Polícia Civil. A decisão judicial contra o acusado só saiu em 2009. Em fevereiro deste ano, o processo transitou em julgado e o juiz da Vara de Execuções Penais do DF determinou a expedição de mandato de prisão.
Outro agente demitido é Horácio Ferreira do Rego. Ele havia sido acusado de arapongagem e foi apontado como responsável por grampear ligações da procuradora de Contas Cláudia Fernanda de Oliveira, entre 2005 e 2006. Depois de um longo processo, o governo só demitiu o policial em fevereiro deste ano.
Distância
Não faltam casos que comprovam a distância entre o surgimento de denúncias e a efetiva demissão dos servidores acusados de malfeito. O ex-delegado da Polícia Civil João Kleiber Ésper foi acusado em 2007 de omitir depoimentos que prejudicariam o senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Em 2010, a Justiça o condenou a quatro anos de cadeia pelos crimes de prevaricação e ocultação de documento. João Kleiber só foi demitido em março do ano passado. Em agosto de 2012, o governador Agnelo Queiroz assinou a cassação da aposentadoria do ex-delegado.
A secretária de Transparência do DF, Vânia Vieira, explica que os processos de demissão podem começar no próprio órgão de origem do servidor punido ou na Corregedoria do DF. “A Secretaria de Transparência funciona como cabeça do sistema de correição. Nossa Corregedoria-Geral pode atuar em casos mais graves, de grande repercussão social, quando a autoridade do órgão está envolvida ou quando a gente percebe que há omissão ou demora injustificada nos processos. Nesses casos, podemos instaurar ofício e o processo correr desde o início aqui”, explica.
Trâmite
Vânia Vieira conta que os casos de abandono de cargo têm trâmite mais rápido e simples, ao contrário de eventuais denúncias, como corrupção. “Os casos mais complexos são os de improbidade ou de valimento de cargo, porque é preciso provar que o servidor utilizou a função para obter benefício próprio. Depois da instauração do processo, ele tem direito à ampla defesa. Se houver demissão ou cassação de aposentadoria, a lei prevê que o próprio governador assine o ato”, explica a secretária.
Em algumas situações de processos judiciais contra servidores, o juiz responsável pelo caso pode determinar a perda imediata do cargo público quando há condenação. Se isso não acontece, cabe ao GDF abrir processo na esfera administrativa até que haja a demissão do servidor acusado de irregularidades.
Até ser demitido, o servidor responde a um processo administrativo que pode levar mais de cinco anos. André Luiz da Conceição, diretor do Sindicato dos Servidores do DF, diz que o direito ao contraditório é sempre respeitado. O sindicato oferece auxílio jurídico aos acusados que são filiados à entidade, mas o diretor reconhece a necessidade de punir os maus funcionários. “A gente defende o servidor porque ele tem direito ao contraditório e à ampla defesa. Sabemos que existem servidores que cometem irregularidades, mas a grande maioria é de comissionados, não de efetivos”, comenta André Luiz. “Isso reforça a necessidade da realização de concursos e da estruturação de carreiras”, acrescenta.
O diretor do sindicato explica que, entre os casos de abandono de cargo, a principal causa são os baixos salários. Na última década, 112 professores foram demitidos por essa razão. “Isso certamente tem relação com a questão salarial”, garante André Luiz da Conceição.
Punição com efeito educativo
Demitida no ano passado, a especialista em políticas públicas e gestão governamental da Secretaria de Justiça Lúcia Helena Alves Santana é acusada de enriquecimento ilícito. No caso da servidora, que era concursada, o processo foi mais rápido. Admitida nos quadros do GDF em 2009, Lúcia Helena se envolveu nas supostas irregularidades em 2011 e, no ano seguinte, acabou demitida pelo governo local.
Segundo denúncia do Ministério Público, ela teria fraudado ata do Conselho do Fundo de Defesa do Consumidor do Distrito Federal e inseriu o número de sua conta-corrente bancária pessoal, induzindo empresas multadas pelo Procon a efetuarem depósitos bancários em seu favor. Ainda de acordo com a denúncia, a servidora se apropriou de R$ 155 mil.
A secretária de Transparência, Vânia Vieira, diz que o trabalho da corregedoria é importante para coibir irregularidades, mas também para servir de exemplo contra a impunidade. “Além de combater a corrupção, a aplicação de sanções devidas ajuda a lutar contra impunidade, o que tem um excelente efeito inibitório. Quando se pune exemplarmente, isso inibe a prática de novas irregularidades”, comenta Vânia Vieira.
Quadro: